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    1 year ago

    Por Camarada Bérnie para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

    Muito se tem falado de uma estética brasileira, busco aqui, talvez, colocar uma contribuição singela a esse debate e faço partindo do meu incômodo sobre como esse abandono ao saudosismo da estética não abandona também o saudosismo a uma nostalgia da revolução e de nosso papel nela. Por isso camaradas, não proponho para nós uma estética brasileira, mas uma estética revolucionária.

    Quero trabalhar isso por uma chave de pensadores que me são muito caros: Ernst Bloch e Mark Fisher

     
    Somos Revolucionários?

    Agarrados ao saudosismo de um passado que julgam brilhante e presos em conquistas do último século, nós nos imaginamos como as reencarnações dos Bolcheviques, de Fidel, Che e seu exército revolucionário, dos Vietcongues, de Ho Chi Min, de Mao, até de Marighella. Camaradas, nós só, e não digo isso para diminuir os méritos, levamos uma grande delegação pro CONUNE, não pegamos em armas, não fizemos sequer a maior safra de arroz orgânico, como faz o MST. Camaradas, não digo isso para diminuir nossas conquistas, mas para apontar que temos comemorado como se comemora o assassinato de um burguês vitórias dentro das gramáticas políticas que os reformistas também disputam. Sei o papel estratégico possível na UNE, mas estou aqui questionando: nós temos agido como revolucionários ou só performado?

    O ponto que trago é que não estamos nas mesmas realidades sociais dessas figuras que citei, não estamos no mesmo momento histórico, enfrentamos o pós-fordismo sem compreender isso, achamos, de alguma maneira confusa, que nossa luta deve ser travada da mesma forma, com o mesmo Horizonte, tratei um pouco mais nisso no texto que fiz com a Camarada Thali “Dos Comunistas que mataram aula”. Mais à frente, inclusive, irei me contrapor a noção de Estética brasileira, que usamos naquele momento. E se todo mundo vier?

    Temos avançado, em algumas frentes, em nosso poder de mobilização, apesar da crise, mas não temos sabido lidar com esse poder e isso revela um sintoma claro, não agimos no sentido para vencer, agimos para perder melhor. Mark Fisher nos provoca: Se chamássemos um grande protesto e todo mundo fosse, nós não saberíamos o que fazer.

    É necessário compreendermos que nossa atuação enquanto militantes comunistas deve caminhar no sentido de, até quando não temos quase nada, chamar a atenção, marcarmos presença, tensionar para o nosso lado e, sobretudo, >lutar para vencer<.

    Peço licença, camaradas, para apresentar aqui um exemplo recente. Nos dias 20 e 30 de Novembro tivemos, aqui em São Bernardo do Campo dois atos, os dois puxados pela Frente povo sem medo a qual compomos aqui na região, o primeiro a Marcha do dia da Consciência Negra, no segundo um ato contra a honraria de cidadão de SBC para Bolsonaro e um de seus filhos. No primeiro ato, apesar de uma quantidade grande de presentes, muitos inclusive para palanque eleitoral (alguns candidatos do PT para a cidade em 2024, principalmente), nós tivemos gritos mal organizados e, no geral, foi um ato confuso, apesar de tudo o significado político da Marcha se manteve e no final ainda fizemos uma fala. Já no segundo ato nós, mesmo com menos militantes presentes de outras forças, tivemos um grande ato onde nós conseguimos puxar a maior parte das palavras de ordem, onde fizemos fala e onde também tivemos protagonismo nas imagens e vídeos divulgados. Esse ato, para mim, foi um exemplo de lutar para vencer, de lutar com horizonte, de puxarmos a nossa linha, onde, de novo, não tínhamos o mesmo tamanho de outras forças, mas soubemos conduzir a atividade como vanguarda.

     
    Sobre arte e estética

    A estética é inseparável da luta para a práxis marxista-leninista, para tanto, irei desenvolver a seguir o mesmo processo que devemos empreender na Luta, mas, dessa vez, na Estética.

    E aqui, fazendo um adendo, coloco estética como toda a maneira pela qual somos assimilados fora da análise teórica, estética está na maneira em que falamos, na arte que produzimos, em nossos panfletos, roupas, bandeiras, ou seja, em toda a nossa comunicação política.

    Já aqui quero pontuar mais do que o significado que atribuímos com nossas práticas, quero avançar no entendimento que temos sobre estética que fuja do Realismo Soviético, tendo em vista que, mesmo com a arte não sendo o motor de nossas lutas, mas sim um acessório conectado a nosso AgitProp, esse Realismo falhou com o avanço do imaginário Comunista e, em formulação teórica, é desprovido de um entendimento pleno da psique humana.

    Ernst Bloch foi um filósofo e professor marxista fortemente influenciado pela psicanálise, sua principal obra foi “O Princípio Esperança”. Neste livro ele desenvolve, dentre outras coisas, um olhar crítico ao Realismo Socialista da URSS, argumentando que uma estética revolucionária não deveria, de maneira alguma, só demonstrar a realidade ou “o que o povo[esse povo abstrato] entende”, visto que, essa estética expressa uma visão extremamente estática, para ele, uma estética revolucionária deve conseguir apresentar as contradições do mundo em que vivemos e apresentar um horizonte utópico e esperançoso. É necessária uma estética que suscite o Desejo revolucionário das massas. Para a crítica ao nosso “realismo” eu trago aqui uma fala de Helena Vieira: “ A gente é um pessoal muito chato, gente, a gente é uma esquerda que é igual à Médico de paciente terminal, nós só damos notícia ruim”

    Mas qual a saída para essa sinuca de bico na qual nos encontramos? Vamos dizer que ela é um tanto ácida…

     
    Comunismo ácido ou por uma estética além da imaginação

    O Comunismo Ácido é, segundo a descrição de Antônio Galvão que recentemente lançou um livro sistematizando o pensamento fisheriano, um acréscimo a luta comunista, não apostando na consciência, mas no desejo, um horizonte comunista que visa “muito mais que impedir a concentração de riqueza de alguns” visando assim “estimular a riqueza comum, luxuosa e exuberante, abrindo espaço e tempo para atividades enaltecedoras, pautadas pela arte, ciência e tecnologias efetivamente emancipatórias”. Este Comunismo “dissolve e transborda as barreiras do discurso anticomunista”, assim abrindo alas para uma sociabilidade “cujo o sentdo esteja para muito além da vazia valorização do valor”.

    O Comunismo, enquanto proposta, precisa ser anunciado como a libertação do Desejo, entretanto, a esquerda tem feito o trabalho oposto a isso. Quem atiça o desejo das Massas é a extrema direita, ela fala da liberação (para um público específico ,claro), nós fazemos manuais de regras do politicamente (esses criticados por Jodi Dean em sua obra “Camarada”) dos quais seguir, estes raramente saem dos círculos da internet, logo, só mudamos (e olhe lá) as atitudes da esquerda digital.

    A Acidez proposta por Fisher vem no sentido de assombrar e dissolver a ordem do Realismo Capitalista, mas também de superá-lo imagéticamente, já que Fisher usou da sua experiência convivendo com muitos psicodélicos (geralmente LSD) da contracultura de seus anos de juventude na Inglaterra Thatcheriana para cunhar esse conceito. Ou seja, sua proposta comunista é psicodélica e foge aos horizontes que nosso “Realismo de Esquerda” têm apontado.

    Usando das palavras de Fisher agora no pouco desenvolvimento explícito que fez sobre o Comunismo Ácido:

    “Comunismo ácido é o nome que dei a esse espectro. O conceito de comunismo ácido é uma provocação e uma promessa. É uma espécie de brincadeira, mas com um propósito muito sério. Aponta algo que, a certa altura, parecia inevitável, mas que agora se afigura impossível, isto é, a convergência da consciência de classe, da conscientização socialista-feminista e da consciência psicodélica. Seria a fusão dos novos movimentos sociais com um projeto comunista, uma esterilização sem precedentes da vida cotidiana. O comunismo ácido refere-se a desenvolvimentos históricos reais e a uma confluência virtual que ainda não se uniu na realidade. Os potenciais exercem influência sem serem atualizados. As formações sociais são moldadas pelas formações potenciais cuja atualização elas procuram impedir. A impressão de “um mundo que poderia ser livre” pode ser detectada nas próprias estruturas do mundo realista capitalista que impossibilita a liberdade.“

    Note, Fisher não diz que o Comunismo Ácido é só a negação do Realismo Capitalista, é algo maior, é algo que toca uma militância genuinamente engajada em lutar e fazer a revolução, entretanto, as possibilidades desse comunismo são observáveis no Deserto do real no qual vivemos.

    Com menos realismo e constatação do real sem futuro, mas também, com mais ácida, psicodelia e horizonte revolucionário, avançaremos.

    Saudações Camaradas